Atlas do carvão: factos, números e impactos do consumo
A Heinrich Böll Foundation e a Friends of the Earth International lançaram esta semana o “Coal Atlas”, uma ferramenta online que disponibiliza os factos e números mais recentes sobre o carvão, e prejuízos ambientais e sociais resultantes do seu consumo. Com mais de 60 gráficos detalhados, o atlas ilustra bem o impacto da exploração de carvão sobre o ambiente, a saúde, o trabalho, os direitos humanos e a política.
Se o mundo quiser evitar uma catástrofe climática nas próximas décadas, terá que renunciar à queima de quase 90% das reservas comprovadas de carvão, mais de um terço das reservas de petróleo e metade das reservas de gás natural. Mas, em vez de implementarem políticas destinadas a concretizar este objetivo, os governos de todo o mundo continuam não só a subsidiar a produção de combustíveis fósseis, mas também a usar os escassos recursos públicos para encontrar novas reservas. Esta é uma situação que tem de mudar rapidamente.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) aponta que os subsídios livres de impostos atribuídos ao carvão (incluindo danos ambientais) atingiram 3,9% do Produto Interno Bruto a nível global em 2015. Só os governos do G-20 atribuíram 452 mil milhões de dólares anuais em subsídios públicos para a exploração de combustíveis fósseis. Um estudo do Natural Resources Defence Council, Oil Change International e World Wild Fund for Nature revelou que, entre 2007 e 2014, os governos desviaram mais de 73 mil milhões de dólares – ou 9 mil milhões de dólares por ano – do erário público para financiar projetos de carvão. Na liderança, está o Japão (20 mil milhões), a China (cerca de 15 mil milhões), a Coreia do Sul (7 mil milhões) e a Alemanha (6,8 mil milhões).
Este investimento aumenta o já substancial financiamento comercial para o sector do carvão. Em 2013, 92 dos maiores bancos mundiais financiaram projetos de carvão da ordem das 66 mil milhões de libras (71 mil milhões de dólares), quatro vezes mais do que em 2005. Tudo para apoiar um setor responsável por emissões massivas a nível global e determinado a não mudar de rumo.
Desde 1988, 35 empresas associadas à exploração de carvão, privadas e públicas, têm contribuído para um terço das emissões totais de CO2. O impacto no ambiente não é segredo. E, no entanto, as empresas que exploram carvão e outros combustíveis fósseis recusaram-se a ajustar os seus modelos de negócios. Em vez disso, trabalham ativamente para bloquear os esforços para mitigar as alterações climáticas a nível nacional e internacional, incluindo através do financiamento a opositores às alterações climáticas e exercendo influência contra metas de energia renovável e instrumentos de mercado bem sucedidos, como as tarifas de injeção na rede.
Enquanto isso, o sector do carvão argumenta que tem vindo a desempenhar um papel indispensável na luta contra a "pobreza energética" - isto é, a falta de acesso a fontes não poluentes de energia, principalmente energia elétrica. É verdade que a pobreza energética é um problema global, afetando cerca de 1,2 mil milhões de pessoas em todo o mundo. Para os agricultores que dependem de água bombeada para irrigar as suas culturas, isto significa menor eficiência e produtividade. Para as famílias que precisam de queimar lenha, fezes de animais e querosene para cozinhar, pode significar poluição do ar interior e doenças respiratórias associadas. Para crianças em idade escolar, a falta de iluminação (ou insuficiente) representa a perda de oportunidades de aprendizagem.
O carvão não é a solução para o futuro. Os prejuízos para a saúde resultantes da extração e combustão de carvão são surpreendentes. Em 2013, a pneumoconiose em trabalhadores de minas de carvão (a chamada "doença do pulmão negro") causou mais de 25.000 mortes prematuras, a nível mundial. Na União Europeia, a combustão do carvão é responsável por 22.300 mortes prematuras por ano. Na China, estima-se que 670.000 mortes prematuras ocorram devido ao consumo de carvão.
Os prejuízos para a saúde acarretam elevados custos económicos, associados com a perda de dias de trabalho e pressão acrescida sobre os sistemas de saúde. As alterações climáticas, também, terão custos enormes, mesmo se não forem tomadas medidas de mitigação e adaptação sobre o setor da energia. Para os 48 países menos desenvolvidos, os custos associados com o carvão irão totalizar, em breve, 50 mil milhões de dólares por ano.
A exploração de combustíveis fósseis não deve ser estimulada por subsídios, mas em vez disso esta atividade deve pagar parte dos prejuízos associados com o impacto das alterações climáticas. Só no ano passado, as duas maiores empresas petrolíferas - Chevron e ExxonMobil – obtiveram mais de 50 mil milhões de dólares em lucros.
Se o mundo quiser limitar o aumento da temperatura global a apenas 2°C acima dos níveis pré-industriais, sem ser forçado a empregar tecnologias perigosas e arriscadas (como a captura e armazenamento de carbono), o modelo energético deve sofrer uma transformação profunda.
Em primeiro lugar, os líderes mundiais devem comprometer-se com a eliminação progressiva do uso de combustíveis fósseis, com o objetivo explícito de manter 90% das reservas comprovadas de carvão, um terço das reservas de petróleo, e metade das reservas de gás no subsolo. Os governos devem também acabar com os subsídios públicos para o carvão e outros combustíveis fósseis, o mais rapidamente possível, dentro dos próximos anos, garantindo ao mesmo tempo que as comunidades mais pobres e vulneráveis não sofrem um aumento dos preços da energia.
Além disso, os governos por todo o mundo deverão manter as empresas produtoras de carvão e outros combustíveis fósseis responsáveis pelos danos ambientais que os seus produtos causado, inclusive através de uma taxa sobre a extração para financiar o Mecanismo de Varsóvia sobre Perdas e Prejuízos, ao abrigo da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas. O direito internacional - em particular, o princípio do "poluidor-pagador", a regra de "não-agressão", e o direito de indemnização – suportam tal sistema.
Finalmente, para enfrentar a pobreza energética, os líderes mundiais devem ampliar o financiamento para projetos de energia renovável e descentralizada, incluindo através de uma tarifa de injeção na rede financiada globalmente para mini-redes de energia renováveis nos países em desenvolvimento.
O sucesso das empresas que exploram combustíveis fósseis na salvaguarda dos seus próprios interesses veio à custa de impactes para o ambiente e da saúde humana. Está na hora de rever o sistema de energia global – a começar por manter no subsolo a maioria das reservas de carvão e outros combustíveis fósseis.